Olhava, silenciosamente, o rio passando diante de mim... Eram restos da civilização se arrastando pelas águas malemolentes. Silentes... inconscientes... tangentes às margens nuas e barrentas... Pedaços de vidas desconexas que seguiam sem saber para onde... Não havia pássaros ou peixes... apenas lixo descartado por alguém... Lembrei-me de quando por lá passei há muitos anos... Algazarra, eu dizia, ao ouvir a profusão de vida naquele rio. Garças, quatis, marrecos, macacos, araras, quero-queros... As matas cercavam o rio e protegiam a vida em seu redor... As águas cristalinas mostravam cardumes indolentes... Pequenas canoas, como a minha, singravam os caminhos... Não havia barulho de máquinas cortando a terra, Apenas os sons da vida selvagem, quase intocada, pura... Pescadores retiravam do rio peixes enormes... surubins... dourados... Onde estão agora? O que foi feito de meu rio? Nada mais restou... Meu rio está morto, assim como a alma das florestas... Meu planeta sofre a dor da devastação que se propaga, célere... Em lugar das matas, imensos campos de soja, sem cor e sem forma... Infinitas pastagens vazias... só o gado, pachorrento, à espera da morte... Em lugar da vida e da diversidade, os mesmos seres escravizados... Os que moram nas cidades, aqueles que nasceram depois de mim, Nunca conheceram a beleza da vida, da Natureza, do silêncio... Apenas os sons dos carros, das motos, dos ônibus, dos zumbis... Imensas concentrações humanas desprovidas de alma, Incapazes de amar, de sentir a fragrância da verdadeira vida... Quanta tristeza...
ago
24
2019