Olimpíadas e Eleições

Não sei se o que mais me incomoda nesses dias é o desequilíbrio emocional de nossos atletas, que resultou em tantas frustrações e decepções que não deveriam ter acontecido, ou se é o horário eleitoral brasileiro, que nos obriga a ver a “cara de pau” desses políticos, que insistem em continuar mentindo descaradamente ao povo brasileiro, como se fôssemos idiotas desmemoriados!

No caso de Pequim (Beijing?), a pergunta que não se cala é como pode uma delegação tão grande trazer resultados tão medíocres? Sempre fomos muito condescendentes com nossos atletas, compadecendo-nos de suas derrotas e recebendo como heróis os poucos vitoriosos que conseguiram agregar ouro em suas bagagens… mas seria esta uma postura adequada e produtiva, ou deveríamos encarar de frente nossos fracassos e tentar extrair desses resultados uma lição positiva?

Onde estamos falhando? Nas finalizações, nos jogos decisivos, depois de uma campanha geralmente brilhante! Sim, nós perdemos pelo desequilíbrio emocional e pela incapacidade de resistir às pressões das expectativas deixadas no Brasil. Chorar não adianta, nem culpar as regras das partidas, nem a perda da vara no momento de saltar!

Não sou um atleta olímpico, mas todos somos brasileiros fanáticos, torcedores ansiosos pelo ouro olímpico e pelos recordes mundiais. Somos um povo pacífico, e talvez isso faça a diferença, pois não sabemos lutar até o fim, até a “morte”, até o último suspiro de nossos pulmões exaustos! Mas esse é o espírito olímpico, a superação extrema, radical, que leva às vitórias e à conquista de medalhas!

Sabemos que o treinamento de um atleta não deve se restringir ao seu condicionamento físico, pois é preciso um preparo mental, uma transcendência espiritual que nos afaste do objetivo imediato do louro da glória e do metal das medalhas. É preciso lutar por cada ponto como se fosse o único, sem olhar para o placar final ou para as possibilidades estatísticas e enganosas das tabelas, que nos levam a supor a vitória antecipada e a perder o espírito guerreiro do vencedor das batalhas!
Creio que o verdadeiro treinamento seja aquele que nos leva aos limites de nossos temores mais profundos, desafiando o pânico e o desespero de não perceber possibilidade alguma de vitória e, no entanto, continuar lutando até o fim! Talvez um treinamento de sobrevivência nas selvas amazônicas pudesse surtir esse efeito… talvez escolher aqueles atletas que, diante do adversário mais difícil, se agigantem e, tal qual Davi, enfrentem seu Golias com determinação e raça, e, mesmo perdendo, se conservem altivos e vitoriosos aos olhos do público!

Há que se imaginar o gladiador, que sabe que será devorado pelos leões, mas não desiste da luta, e valoriza seu desfecho fatal ao mostrar à fera que não é um ratinho medroso, mas um valoroso guerreiro que cai, mas não se entrega ao desespero e à vergonha de perder encolhido e choroso, humilhado e ridicularizado pela horda de fanáticos que urram nas plateias ao verem seus corpos serem despedaçados!

E as eleições? Sim, os políticos estão novamente por aí, mostrando-se conhecedores das mazelas do povo oprimido, cada um prometendo o que não pode e não pretende entregar, sem nenhuma vergonha estampada em sua “cara de pau” costumeira… então, por que votamos? para que continuar elegendo aqueles que irão nos roubar, nos enganar e rir de nossa ingenuidade infantil?

Está na hora de reagir, de enfrentar o fracasso desse modelo político ancião e moribundo!

O mundo se tornou Capitalista e optou pelo enriquecimento a qualquer preço, desde que os detentores do poder permaneçam os mesmos, aquela mesma casta burguesa nascida da decadência da realeza da corte da França de Antonieta! Sim, pois o poder está com os milionários, novos ou quatrocentões, aboletados em suas fortunas indecentes, sugando o sangue dos trabalhadores sem esperança, que ainda acreditam na permeabilidade social desse imenso canavial, que também é o das plantações de soja e das fazendas de criação de gado.

Enquanto isso, magnatas do campo, do alumínio e da celulose das matas de Pinus e eucalipto devassam nossas florestas verdadeiras, transformando-as em pastagens imprestáveis, extraindo nossas riquezas para seu deleite e prazer. Seria essa nossa vocação política?

Eu não voto mais nesse país de arrogantes! Como deixar que minha opinião política seja utilizada para conservar no poder essa minoria privilegiada? Deixei de votar em 2003, com as indecências do PT e do PSDB, os dois partidos que ainda se julgavam sérios e honestos…

Pensem nisso! Lembrem-se de 1974, quando o voto de protesto contra a ditadura militar assumiu proporções alarmantes para a classe política, levando-os a reavaliar suas posturas e reconsiderar a certeza de que o povo seria uma massa disforme e manipulável pelos interesses das classes dominantes. Está chegando a hora de uma nova reação pública de repúdio à imoralidade administrativa! Eu voto nulo!

Síndrome da “Terezinha”

Quem, como eu, teve o privilégio de viver os anos 70, não pode se conformar com a degradação moral e intelectual de nossos dias. Digo isso com pesar e constrangimento, pois essa é a nossa herança para a geração de nossos descendentes, nossos filhos, nossos netos…

Quando a televisão brasileira se estruturou, no Brasil, nos anos 50 e 60, foram criados programas importantes como a “TV de Vanguarda” e a “TV de Comédia“, da TV Tupi, verdadeiros palcos teatrais pelos quais passaram dramaturgos e atores da mais elevada expressão artística nacional, proporcionando Cultura ao nosso povo e estabelecendo padrões de qualidade que, infelizmente, não prosperaram.

Sim, pois aquele que hoje é tido como o maior fenômeno de comunicação da mídia televisiva brasileira, o Chacrinha, foi quem estabeleceu, também, suas regras de marketing, adaptadas da máxima falaciosa de “dar ao público o que ele quer”, ou seja, “vocês querem bacalhau?“…

Talvez a expressão merda, manifestada aos artistas antes do início do seu primeiro espetáculo, seja decorrência desse desejo ancestral de superar a fase anal da criança que permanece em todo o ser humano, a despeito de sua cultura, inteligência e originalidade.

Quem assistiu aos “Concertos para a Juventude” ou até mesmo às primeiras exibições que fizeram a fama do mais antigo programa da televisão brasileira, o “Fantástico“, nunca imaginaria que se chegasse tão fundo na oferta “cultural” de nosso meio de comunicação mais abrangente! O que sobrou hoje? Talvez apenas uns poucos documentários reprisados à exaustão pelas emissoras de TV a cabo…

Duas gerações se passaram desde então, e nossos valores éticos e morais se esvaneceram, definharam, sucumbiram pela ação nociva e persistente das novelas globais, desagregando a família e corroborando uma crise intelectual sem precedentes na história da humanidade.

Hoje, paradoxalmente, todo mundo “sabe” de tudo o que se passa ao seu redor, consegue “dar palpites” sobre qualquer assunto, sem, contudo, demonstrar a originalidade e a reflexão características de uma inteligência perspicaz, evidenciando a homogeneidade e a ingenuidade simplória do pensamento que caracteriza o universo contemporâneo…

A maior crítica que se fez sempre aos regimes socialistas foi a falta de liberdade de expressão, imposta ao povo pelos governos totalitários, para os quais o interesse coletivo se sobrepunha aos interesses individuais e a ideologia do partido se impunha às ideologias dos pensadores. Críticas verdadeiras. Paradoxalmente, porém, a existência dessa dualidade de pensamentos, essa dicotomia profunda entre as liberdades individuais e os interesses coletivos, alimentava o pensamento intelectual e enriquecia o conhecimento filosófico, a despeito das suas graves conseqüências.

Se o mundo viveu anos de terror causados pela guerra fria e pela intolerância dos regimes políticos, a humanidade ganhou em sabedoria e em obras de inestimável valor cultural. Reflexo disso é o “Cinema de Arte” que prevaleceu durante mais de uma década, produzindo as mais belas expressões culturais do século XX. O mesmo se deu com a música, a literatura e o teatro hispano-americanos nesse mesmo período.

Hoje, no entanto, a música, a literatura, o teatro, as artes plásticas, o jornalismo e, principalmente, a televisão, vivem o mais tenebroso obscurantismo intelectual de nossa história, alimentado pelo imediatismo da notícia “em primeira mão”, pela ansiedade do mundo eletrônico “sem fronteiras” e sem privacidade, pela ganância insaciável de uma civilização que não tem limites para o ganho desmesurado, para o consumo supérfluo e para a projeção social, a ambição e a vaidade de cada indivíduo, em detrimento dos valores coletivos e do sentimento humano.

Daí, a Síndrome da “Terezinha”, uma compulsão irrefreada por entregar ao público aquilo que choca mas não enriquece, excita mas não enobrece, dá ibope mas não tem valor. Por isso, as empresas investem cada vez mais na propaganda barata, vagabunda e estúpida da guerra de preços e de ofertas fantasiosas e mentirosas, da venda de qualquer coisa, a qualquer custo, para qualquer um.

É deplorável que assim seja, mas a cada dia existem menos seres pensantes na face da terra, menos pessoas capazes de conduzir seu próprio raciocínio e chegar a uma conclusão coerente, a ter suas próprias idéias, a ser original, a ter domínio sobre seu próprio destino, enfim… por isso, é difícil continuar seguindo a jornada, pois isso também acaba por se revelar, apenas, mais um desprezível slogan:

Keep walking, Johhny Walker“!