Quando Shackleton se viu diante de uma situação insustentável, ele não se desesperou; confiou em seus homens e expôs cada nova dificuldade sem ocultar nenhum detalhe. Eles estavam sob gravíssimo risco de vida: seu navio encalhou no gelo e, gradualmente, se despedaçava sob seus pés!
Quando teve que abandonar seus homens para buscar ajuda, novamente, não titubeou: selecionou um pequeno grupo para acompanhá-lo e prometeu aos demais que voltaria para resgatá-los; e eles acreditaram e confiaram em seu líder! Shackleton cumpriu sua promessa, e nenhum de seus homens perdeu a vida nesse épico feito!
Um exemplo que não foi seguido pelos líderes e empresários que o sucederam, apesar da enorme repercussão que teve seu feito até os dias de hoje. As práticas tradicionais e ineficientes continuam a prevalecer na maioria das empresas, onde a figura do chefe se impõe à do líder.
E por que as empresas ainda insistem em administrar seus recursos como se fossem maquinários, peças de um equipamento, objetos sobre os quais acreditam ter a posse e o poder de mandar e o direito de exigir?
Não é fácil montar uma equipe, e muito mais difícil é confiar nela… para o líder, chefe, gerente ou superior hierárquico (seja qual for o entendimento que cada um tem da função de administrar pessoas), é mais fácil delegar funções, cobrar resultados, exigir obediência e acreditar que cada indivíduo preza mais seu salário do que a satisfação e o orgulho de ter o seu trabalho realizado.
Peter Drucker era um otimista! E acreditava que as organizações estavam mudando – para melhor! Talvez seja verdade; porém, a velocidade com que as organizações se transformam e se adaptam às novas práticas não nos permite antever uma revolução na arte de administrar pessoas. Muito pelo contrário!
Sim, pois ao menor sinal de tormentas, aquele líder carismático se converte em “feitor” e a democracia dá lugar ao autoritarismo mais radical! Esse comportamento está relacionado com a natureza humana em seu atual estágio evolutivo e a maneira com que a sociedade forma seus filhos.
Porém, o mundo se transforma sob o impacto avassalador das novas tecnologias, a China se destaca como o mais novo ‘player’ das grandes nações capitalistas, e os negócios eletrônicos exigem novas posturas, agilidade de decisões, controle sobre resultados, personalização (tailor-made) e qualidade nos produtos e serviços.
Como sobreviver a essa realidade sem mudar as práticas administrativas?
Pois será justamente essa pressão das demandas do nosso Admirável Mundo Novo que determinará a adoção de práticas mais flexíveis de gerenciamento de pessoas.
Peter Drucker afirmava, com propriedade, que estamos diante de novos “trabalhadores do conhecimento”, já antes batizados de “colaboradores”, eufemismo para a antiga e mais verdadeira denominação de “empregado”.
Um novo conceito de valores nasce da constatação de que o grande patrimônio de uma organização consiste de seu acervo cultural, ou seja, do conhecimento intelectual de seus empregados, que fazem a real diferença competitiva diante do mercado e da concorrência! Porém, são escassas as experiências que perduram desse respeito aos profissionais.
No Brasil, devido à forte carga tributária que incide na contratação, manutenção e demissão de funcionários, existe um grande número de trabalhadores “informais”, ou seja, sem vínculo empregatício ou carteira assinada.
Existe, também, um número expressivo de trabalhadores “terceirizados”, que prestam serviço através de cooperativas, empresas fantasma ou de empresas individuais. Essa realidade distorce os processos gerenciais e dificulta a migração dos métodos de gestão para o modelo preconizado por Drucker, uma vez que cria “trabalhadores de segunda classe”, sem direitos, benefícios formais ou garantias de emprego.
Para que as propostas de Drucker se tornem reais no Brasil é necessário que os empreendedores percebam que existem perdas camufladas nessas práticas oportunistas, principalmente a falta de comprometimento desses profissionais, que se sentem aviltados em seus direitos trabalhistas, e não são reconhecidos em seus esforços por realizar atividades de valor para a empresa.
A comparação, feita por Drucker, do trabalho de um gestor de recursos humanos em uma organização com o de um maestro é digna de destaque: nenhum outro trabalho pode se comparar, em comprometimento e em resultados, com o dos músicos de uma grande orquestra, na qual um pequeno desafino ou uma nota errada de qualquer dos instrumentos compromete definitivamente o resultado de toda a equipe.
Vale a pena assistir ao magnífico filme de Federico Fellini, “Ensaio de Orquestra”, uma paródia do totalitarismo hitleriano representada por um maestro autoritário e por músicos arrogantes… o oposto às figuras admiráveis que temos em nossas mentes quando idealizamos uma orquestra.
Finalizando, a questão da motivação, que nos causa tantas polêmicas: todos conhecem, ou já ouviram falar da Pirâmide de Maslow, que estabelece uma hierarquia de valores, ou necessidades, que determinam o grau de satisfação do ser humano em sua trajetória na vida.
Nessa conceituação, para que o Homem se satisfaça, terá que galgar cada uma dessas necessidades: fisiológicas, de segurança, de relacionamento e de estima, até que conquiste sua realização pessoal. Embora superados, esses conceitos ilustram com propriedade a necessidade que temos de conquistar o respeito e a admiração da sociedade pelo nosso trabalho, para sermos felizes.
Voltando a Peter Drucker, a emergência desses novos trabalhadores do conhecimento seria o caminho adequado para o engrandecimento do indivíduo e para o desenvolvimento das organizações, seja em suas funções sociais, como empregadora de pessoas, seja em suas necessidades de crescimento e de geração de lucro e riqueza para seus acionistas e para o País.
Comparando-se esses conceitos com a figura de Alexandre da Macedônia, poderíamos afirmar que, nas batalhas contemporâneas, o “general” já não comanda seus exércitos de forma autoritária, e precisa da adesão voluntária e comprometida de seus liderados para conduzir suas tropas à vitória e sua empreitada ao êxito. Não há como se tomar decisões isoladamente em um mundo complexo e dinâmico como o nosso. Ninguém teria sequer conhecimento suficiente para isso!
Muito bom texto! parabens pela sensibilidade de argumentar cada palavra chave para melhor compreensão