Desconsolo

Se a dor da vida me enfraquece e cala,
O que fazer de toda essa emoção contida?
Por que me foi negado o fim da história,
Se os erros meus se sublimaram nesta solidão perdida?

E aqui me encontro, novamente, em prantos,
Por não poder manifestar minha paixão sofrida…
E as horas passam numa angustiada espera,
Que não se encerra, a alimentar a ilusão sentida.

E você segue seu caminho, sem me ver ao lado,
A recolher migalhas de seu coração partido…
Desconsolado, já nem mesmo me incomodo
Em disfarçar tamanha humilhação vivida…

E me entrego, enfim, a essa triste sina,
A confundir a imaginação… e a verdadeira Vida!

por João Carlos Figueiredo Postado em Desconsolo

Angústia

Por que me seduziste novamente
Se negas teu amor, sem compaixão?
Meu peito aperta angustiosamente,
Dilacerado em dor e solidão…

Se, ontem, fui feliz, por um momento,
Inebriado em sonho e ilusão,
Agora, recompõe-se o meu tormento,
Abandonado e só, sem compreensão.

Não tenho teu carinho, nem afeto,
Nem sei por onde estás, meu coração…
A trama de Pierrot eu interpreto,
Calado o grito mudo da paixão.

E, mesmo procurando ser discreto,
Confesso minha culpa, e estendo a mão…

Luna Llena

Escotilha iluminada

Na infinita ausência de luz…

Assim te vejo, Lua,

Passagem entre Universos,

Boca de um cone

A se perder na ignorância do Ser…

Não existes,

Senão na imaginação dos amantes,

Ou nas pegadas dos astronautas,

Derradeiros visitantes do passado…

Ambos extintos Pela absoluta abstinência da Paixão…

por João Carlos Figueiredo Postado em Luna Llena

Desencontro

Teus olhos ao alcance dos meus olhos,
Tuas mãos, quase ao calor de minhas mãos,
Teus lábios a murmurar em meus ouvidos,
Meus lábios a ansiar os lábios teus…

Ali, quase a tocar-nos, tua ausência…
Parte de um sentimento se perdeu…
Constrangidos pensamentos que vagueiam
No silêncio de um desejo apenas meu.

E a noite se arrastando pela vida,
E o tempo a se perder em meus sentidos,
Minh’alma a reclamar tua presença,
Teu corpo a recusar minha paixão…

Viver é…

Viver é superar os seus temores,
É entregar-se a vinte mil amores,
E descobrir-se só…

Viver é enfrentar os riscos desmedidos,
É renegar seus ritos mais antigos,
E reduzir-se a pó…

Viver é mergulhar na mais profunda solidão,
Expor-se aos perigos de mais uma ilusão,
E sublimar-se em dor…

Viver é sentir-se completamente ensandecido,
Abandonar-se ao mais desconhecido,
E perceber-se nu…

Viver é quase nunca dizer “não”,
Ao ser amado entregar sua paixão,
E desdenhar seu dó…

Viver é nunca mais deixar de partir,
Ao seu passado só saber sorrir,
E, novamente, descobrir-se só…

Imaginação

Tenho-te em minha memória,
Tão real, tão perfeita,
Que, às vezes, pego-me a falar sozinho…
A abraçar meus pensamentos,
Como se vida fossem…

Mas não há vida na imaginação…
Apenas lapsos de emoção desperdiçada,
Fragmentos de sensações
Em um mosaico abandonado…

Mesmo assim,
Apego-me a esses frangalhos
Como um náufrago
Aos destroços de sua embarcação…

E sigo, então, o meu caminho,
A preservar meus sonhos…

Miragem

A luz se refletiu em teu sorriso

E encantou meus pensamentos.

Teus lábios, face, corpo, num momento,

Tornaram-se a visão do paraíso…

Por isso, em vida e sonho, só em ti penso,

Extasiado diante da delicadeza,

Alma, forma e Ser, pura beleza,

Razão maior de um amor intenso…

Sentimento que me arrebata

E se propaga em minhas veias num instante,

A despertar desejos…

A reviver motivos…

A preencher meus olhos…

A enrubescer-me a face…

A apaixonar meu coração!

por João Carlos Figueiredo Postado em Miragem

Tênue esperança

Você surgiu assim, feito um encanto,
Que se desfaz em sonho, ao despertar.

E não se explica, em mim, tão simplesmente,
Miragem a se esvair na areia de meus olhos,
Tremeluzente instante na eternidade do passado…

E somente ele (o passado) existe,
Além da própria imaginação…

Alento a nos manter despertos,
Na frágil esperança de enriquecer a história
De tão pequeno e insignificante caminhar…

Pierrot

Ontem, quando nasci, eu já tinha 30 anos. Negou-se-me, assim, a minha juventude. Percebeu-me a vida quando minhas filhas me encontravam nesta transitória passagem “pelos campos do Senhor”.

Despertado dos sonhos, acreditei não ter, ainda, existido; confesso, pois, que não vivi.Nessa dicotomia, corpo e alma defasados no passado, aqui me deparava com essa terra de mudanças, onde o “tudo” ao “nada” precede, e a morte em vida se acaba.Pois é assim que, nascido prematuro e louco, a consciência recobro justo quando a vida se me nega as infinitas possibilidades que aos demais oferece, generosamente.

E nesse paradoxo do tempo em que me encontro, tua beleza a mim se interpõe, ao mesmo tempo recusando o que se me oferece, apenas por ter estado aqui por mais tempo (muito mais) do que deveria ter ocorrido.

“Uma rainha”, pensei, “jamais uma princesa”. Não pela incontestável beleza, bem o sei, mas por já estares pronta, completa, perfeita em tua exuberância arrebatadora.

Ali estavas, diante de mim, vida manifestada em sua plenitude impecável, deliciosos momentos de inexplicável sedução.

E, ao recobrar a consciência – não a razão, ou juízo – nada mais sou que eu mesmo, prematuro ser anoitecido e inconformado pela vida que a mim se negava.

Quase perfeita, a noite se acaba, restando a madrugada fria, insone, infinita, repleta de lembranças do que não houve e nunca será…

por João Carlos Figueiredo Postado em Pierrot

Inquietude

Vivo por contestar.

E por que não ser assim?

Aos acomodados, a cotidiana vida!

Nos extremos encontro a seiva que me alimenta e provoca.

Nas nuances e sutilezas busco as diferenças da monotonia das recorrências que me sufocam a alma.

Vivo por divergir.

Por que calar-me?

Aceitar a opinião corrente das mesmices e do tédio asfixiante é reconhecer-se morto… Eternamente…

Tento observar sempre o lado oculto das objetivas (subjetivas?), captando o que fugiu de minha retina… Sorrateiramente…

Fujo das maiorias massificantes, espécie mórbida de velório das multidões saciadas do medíocre prazer da estabilidade e do sossego.

Salto os capítulos da novela desta vida, onde os cenários já montados dispersam a consciência e a atenção dos transeuntes seres dessa terra.

Persigo a ansiedade irrequieta e instável do efêmero instante em que a ave pousa, o galho cede, a cobra salta de um só bote, e o mundo estremece de pavor diante do desconhecido e do incerto, da impossível paz que não se sustenta no improvável acerto de contas do Ser com seu passado tão comprometido…

Anseio pelo delirante êxtase do vir a ser que não se consuma no presente, pois, só assim, é possível Viver!

por João Carlos Figueiredo Postado em Inquietude

Desânimo

Algo me diz, internamente, que meu entendimento é vesgo, minhas palavras, confusas, meu pensamento, equivocado, meu universo, irreal e absurdo. Sim, é isso mesmo que acontece: sou uma aberração dessa natureza em que penso estar vivendo; ela, de fato, não existe, assim como eu. Não fosse isso, e tudo aconteceria normalmente, as pessoas a quem amo compreendendo minhas ansiedades e preocupações, sem que eu tivesse que manifestá-las a cada instante, os amigos me aconchegando com palavras doces e sinceras, de estímulo e consideração, a justiça se fazendo acontecer naturalmente, como simples consequência de nossas atitudes corretas e decentes…Mas não é nada disso: a vida é tão-somente o que dela percebemos. Alguns se enganam, constantemente, com palavras e mensagens que se repetem indefinidamente neste mundo virtual, talvez até muito mais real do que a própria realidade que pensamos perceber e em que acreditamos viver. Outros se abalam, se desesperam, se debatem e lutam por tentar mudar a sua própria situação, ainda que em detrimento de quaisquer outros que estejam, de alguma forma, em busca dos mesmos espaços, dos mesmos anseios, de sonhos semelhantes. Outros, ainda, se conformam, se acomodam e aceitam, placidamente, seja pela fé ou pela descrença, que a vida é isso mesmo. Nada mais…E é assim que passamos nossos dias, deixando que o tempo nos envelheça, que os amigos nos abandonem, que o mundo se torne, pouco a pouco, um lugar insuportável e triste, feio e desolado, nas planícies esculpidas por nossa solidão. É isso mesmo, apenas isso…

Nada mais…

por João Carlos Figueiredo Postado em Desânimo

(des)conforto

Como saber se ainda estou desperto

Se as sombras de meus pesadelos ofuscam-me o entendimento?

Meus olhos permanecem abertos,
Filtrando as luzes matinais que jorram das janelas.

Meu ser incerto mergulha no infinito,
Perdido em labirintos de tantos pensamentos.

Meu corpo extático, esquecido,
Sem alma dentro, ou alguma finalidade pouca que eu perceba…

A vida segue, no entanto, ao derredor,
Pulsando, célere, nas veias abertas da cidade que eu detesto.

E nada há, além do firmamento,
Somente a morte, a me espreitar, dolente,
Sabendo ser este o meu destino, finalmente.

Trilhas Urbanas

Asfalto não se demarca, como uma trilha no mato. Porém, entre os desfiladeiros dos prédios enfileirados, quase dá pra perceber o rastro dos andarilhos, dos carros desatinados.

A pressa é tanta e tamanha que passa tudo de lado: retratos no outdoor, garotos esfaimados, os postes, fios, bueiros, o cheiro desagradável, garotas bem maquiadas nas calçadas, nas esquinas, buzinas desenfreadas, e mesmo os malabares jogando fogo pro alto.

Seguem o mesmo trajeto nos carros, metrô e ônibus, a pé ou de bicicleta, deixando, sempre, pra trás, o tempo desperdiçado. Quase dá pra perceber o zumbir dos pensamentos cruzando nos cruzamentos das ruas e avenidas desta cidade encantada.

Os seres nem se desculpam pela grita e a freada, pelo puro esquecimento de um gesto ou uma risada.

Seguem cegos, os autômatos, como bois numa manada, sem mesmo deixar registro dos rastros pela estrada. Às vezes, nem se apercebem que chegaram a seu destino, e prolongam mais um pouco o correr e o desatino, até mesmo pra passar outro louco no caminho.

Repetem, dia após dia, os pensamentos passados, como reza ou a desdita gravada fundo na alma. Com os pés, ou com o solado de seus carros importados, vão deixando para trás os espaços percorridos, pedaços já esquecidos das trilhas não demarcadas.

É curioso, no entanto, o destino desse povo, que rumina, sem parar, suas desgraças e tristezas, mas se esquecem, com certeza, que alienam suas vidas em troca do dissabor. Dia após dia repetem as urbanas trilhas da dor, sentimento tão presente em seres desconhecidos, que agridem, gritam e clamam, sem perceber a razão.

Percorrem o mesmo caminho, urbanas trilhas visíveis, apenas aos que conseguem parar o tempo e o espaço, observando a demência de tantos desesperados.

Ao fim do dia, cansados da longa jornada de stress, retornam pelas travessas da cidade em desalinho, das longas filas de espera, mil buzinas no caminho, a relembrar, incessantes, que a vida desenfreada vai se tornar o destino dos seres desenganados a viver sem esperanças de um dia, enfim, se livrarem das trilhas intermináveis, urbanas e delirantes.

Ao final de uma semana, exaustos e desgastados, buscam, nos parques e praças, novas trilhas a seguir, a recompor suas forças para enfrentar, novamente, o mundo em competição. E lá, no verde do espaço dos terrenos confinados, mal percebem as belezas dos lagos, repletos de pássaros, a viver, despreocupados.

Em vez disso, outra vez, seguem as trilhas urbanas dos seres desencantados, a caminhar, desgastados, arfando, angustiados, a mostrar os seus semblantes perdidos, desconfiados, percorrendo, pelo asfalto, os trechos bem demarcados dos caminhos verdejantes.

Contam, nos passos marcados, seu caminhar compassado, olhando, a cada instante, o relógio intolerante, a ditar seu infortúnio de escravo alforriado, que não sabe desfrutar a vida em liberdade, e lutam por preservar as correntes, as amarras, que reduzem a sua mente ao silêncio e à escuridão.

Trilhas urbanas os levam à pobre meditação, ao pensamento corrente, à tristeza e à solidão.