Havia uma lenda que dizia de uma árvore gigante, com mais de mil anos, que vinte braços não conseguiam circundá-la, e que lá permanecia, teimosa, renitente, insistindo em permanecer testemunha das barbáries humanas, a despeito das vontades das enxadas, das foices e do fogo, ano após ano, silenciosa e perene… Resolvemos conferir; afinal, era tão próxima à estrada que quase podíamos vê-la.
Entramos na mata e o frescor da sua sombra generosa nos acalmou quase instantaneamente, trazendo-nos a paz que somente a natureza consegue produzir. Uma alameda larga cortava a floresta, exibindo a nudez da terra amassada pelos pés dos transeuntes desatentos. Uma colônia de macacos nos chamou a atenção pela algazarra de seus gritos, saltando entre os galhos entrelaçados das árvores.
Bosque dos Jequitibás
Que belas árvores são os jequitibás! Troncos esguios, alongados e cobertos de uma casca enegrecida, a folhagem bem no alto, minúsculas folhas para uma árvore dessas dimensões. Para cada uma, a mata se afastava, respeitosamente… zelosamente…
Andamos por cerca de meia hora, apreciando cada planta oculta nas sombras da floresta, quase tentando prolongar a espera pelo jequitibá histórico, testemunha dos tempos… Ao longe, já se avistava a copa de uma árvore gigante, destacada das demais. Seria ela?
Cogumelos de toda espécie se escondiam nos troncos caídos, entre folhas úmidas, preservando o húmus da mata, assegurando o equilíbrio instável provocado pelas intervenções humanas, predatórias e inconseqüentes.
O canto das aves ecoava na floresta remanescente, mas não conseguíamos perceber onde se escondiam. Sentíamos o cheiro do mato, observávamos a luz filtrada entre as plantas, em raios suaves, transparentes, efêmeros. O dia já se extinguia e precisávamos nos apressar.
Pequenas placas de madeira, escritas a mão, identificavam as espécies de árvores mais expressivas, algumas com troncos retorcidos, folhas grossas, outras parecendo de marfim, brancas e lisas, folhas filigranadas e delicadas, alguns arbustos, próximos uns aos outros, concorrendo pela busca da luz do sol, poucas árvores imensas, altivas e elegantes, hospedando parasitas comensais.
De repente, diante de nós, uma clareira enorme e, em seu centro, uma árvore gigantesca, quase 50 metros de altura, sozinha e esplêndida, dominando toda a paisagem ao seu redor. Era ela, com certeza! Lá estava, destacada pela grandiosidade de seu porte único! A placa dizia que existia há mais de 3.000 anos! Dez séculos antes da era cristã, essa árvore nasceu! Conviveu com todas as civilizações da Terra!
A emoção tomou conta de nós, emudecidos diante desse monumento da natureza. Sem palavras, quedávamos admirados, extasiados com tanta beleza e grandiosidade! Nenhuma edificação humana poderia se comparar a ela e, no entanto, ali estava, frágil, à mercê dos males do mundo, tão próxima da devastação que a circundava, ameaçada pela vileza dos homens, que sequer sabem de sua existência.
Permanecemos ao seu lado, solidários, apreciando cada galho, cada folha, a sombra que se projetava, as sementes espalhadas generosamente pelo chão desnudo, a mata silenciosa e respeitosa ao seu redor. Estávamos paralisadas diante dessa beleza única!
Parecia que ali o tempo não existia, apenas as cenas se modificavam em seu entorno. Para ela, éramos um instante ínfimo, insignificante. Ficamos sentados à sua sombra até que fomos despertados desse sonho pelo guarda florestal, avisando-nos que o tempo de visitação havia se acabado, e deveríamos deixar o parque. A contragosto, caminhamos, lentamente, para a saída e para a "civilização".
Sua imagem ainda permanece viva em minha memória e nas fotos que conseguimos tirar naquele dia… e cada vez que passar por aquela estrada, voltarei a ela, reverentemente, respeitosamente, ansiando por saber que ela continuará viva para sempre…
(para quem quiser vê-la: Parque Estadual Vassununga, Rodovia Anhangüera, Km 252, próximo a Santa Rita do Passa Quatro)